Fernando Brito
Ela está quase porta afora.
Expulsa de casa pelos seus filhos mais pródigos: os políticos e o Ministério Público, que assumiu, sob o reinado de Sérgio Moro, a autoridade formal sobre o país, usando a Polícia Federal como sua guarda pretoriana e a mídia como sua legião romana.
A legalidade democrática vai embora, finalmente, de nosso país, depois de ter voltado, a duras penas, três décadas atrás.
Entramos num processo do qual não sabemos o fim.
Se uma presidenta eleita não teve firmeza para resistir às pressões dos políticos e dos mercados, aceitou seu jogo de chantagens e seu programa recessivo, como resistirá um governante que chega ao topo do poder à custa do compadrio generalizado e com a promessa de cortar e cortar a ação de um Estado que já é tímido e omisso em tantas das necessidades do povo brasileiro?
Os políticos e os partidos parecem não se dar conta disso, acostumados a ler a realidade através do que diz a mídia e o mercado.
Existe um outro Brasil, o qual esta gente não apenas despreza, mas que não compreende.
Que corre por debaixo, como um rio subterrâneo, da casca de realidade aparente.
Nos governos petistas, este Brasil ensaiou aparecer à superfície. Vai submergir, outra vez, sabe Deus por quanto tempo.
A destruição de Lula, que foi sua referência, é, por isso, o alvo central do projeto excludente e reacionário que volta, reconheçamos, porque as portas a ele foram abertas quando se adotou a lógica econômica anticrise que nunca funcionou e nunca funcionará, porque o Brasil não pode conviver com o atraso e a exclusão dos que pensam nele como um país para 30 ou 40% de seu povo.
Esta movimentação invisível, surda, oculta, cedo ou tarde vai aparecer e, quando aparece, é uma torrente que arranca pedaços das margens institucionais em que se tenta conte-la.
Ninguém, muito menos eu, sabe de que forma isso irá ressurgir, porque a natureza dos povos tem muito de insondável.
Os líderes são sempre menos que as massas que lideram, mas são catalizadores indispensáveis às transformações que elas geram.
Que os nossos, os que sobrevivem e os que virão, tenham a sabedoria de entender que não é deles a força, mas é do povo.
Estamos um pouco mais céticos, mas isso é bom.
Sabemos que a democracia não voltará pelas mãos dos que as enxotaram e que é preciso não perdê-la de vista, para que ela possa voltar.
Porque a causa conservadora, a que reduz o Brasil a um país chinfrim e seu povo a apenas uma parcela da população não pode viver muito tempo em presença de um regime que dá a toda a população o direito de exigir e o direito de decidir.